Imagine um robô que, mesmo sendo feito de fios e circuitos, tem sonhos de estar em uma cena de O Mágico de Oz. Esse protagonista, com um otimismo contagiante, se comporta como se fosse um humano de verdade, com coração pulsando e veias cheias de vida. Ele não é só um monte de metal; ele age como qualquer um de nós. A animação Meu Amigo Robô, de Pablo Berger, baseada na graphic novel de Sarah Varon, utiliza essa ideia e transforma em realidade. Aqui, o robô é projetado pra ser um companheiro fiel, mesmo que exija uma montagem inicial. É a prova de que, mesmo feito de peças mecânicas, ele busca algo mais: conexão e emoção, como qualquer ser humano.
A dupla dinâmica que dá o tom certo para essa animação é o Cão — o clássico clichê de “melhor amigo do homem” — que se mostra tão afetuoso com um robô feito de metal e circuitos. A relação deles começa de um jeito inusitado: o Cão viu um comercial à noite e decidiu comprar o robô, transformando essa transação em algo muito mais profundo. O vínculo entre eles se fortalece e é testado de maneiras emocionantes, fazendo desse filme uma verdadeira explosão de sentimentos. O Robô pode ser programado com inteligência artificial, mas seu coração, embora mecânico, é real. E acredite, essa história vai tocar e emocionar de um jeito que você não espera.
Ambientada em uma Nova York cheia de vida e criaturas falantes, a adaptação de Berger traz um humor irônico e uma sinceridade que capturam a necessidade de conexão. O diretor espanhol tem uma liberdade total para acrescentar suas referências culturais, como o cachorro que vive em um quarto no Lower East Side, decorado com um pôster de Dark Side of the Moon na parede. Essa cidade, apesar de toda a agitação, faz o pobre cão sentir um isolamento brutal — é o tipo de lugar onde você vive cercado de animais antropomorfizados e mesmo assim se sente mais sozinho do que nunca. Em uma cena quase tragicômica, ele vê um alce e uma vaca se aconchegando em um apartamento do outro lado da rua, então essa solidão se manifesta. Mas a salvação vem na forma de um comercial na TV que promete um amigo fiel, a apenas um pedido de distância.
Quando o robô finalmente chega, poucos dias depois da recomendação do Cão, a transformação é instantânea. O mundo se torna um espetáculo para esse robô recém-despertado, cheio de inspirações, desde os músicos de rua no metrô até os punks mostrando o dedo do meio pra ele. É uma explosão de alegria para o Cão, que agora pode dividir as pequenas vitórias e frustrações do cotidiano com seu novo parceiro. Juntos, eles vivem um dia perfeito em Nova York, culminando em uma dança improvisada de patins ao som de “September” do Earth, Wind and Fire, enquanto assistem ao pôr do sol de um dos pontos mais icônicos, sob a Ponte do Queensboro. É pura mágica, um momento que gruda na memória e faz você acreditar na força das conexões humanas.
Mas como é que você supera esse momento perfeito de felicidade, aquela lembrança que brilha mesmo quando a imagem começa a desbotar? A solução é uma viagem à praia. Estamos quase no fim do verão, e o Robô nunca sentiu a emoção de estar ali, cercado por outros seres famintos por um último banho de sol. Depois de horas se divertindo nas ondas e um cochilo que se estende até o escurecer, eles acordam e percebem que estão sozinhos. E o pior: a combinação de água salgada e areia não é nada boa para um ser mecânico como o Robô. Ele simplesmente não consegue se mover e é pesado demais para o Cão carregar. Agora, os dois estão numa fria, presos em uma situação que parece não ter saída.
Quando o Cão volta para resgatar seu amigo no dia seguinte, ele se depara com Ocean Beach fechado, esperando até 1º de junho para reabrir. A situação não é nada promissora: uma petição ao departamento de Parques e Recreação de Nova York vai a lugar nenhum, e as tentativas de resgate fora do horário comercial só atraem a polícia, que sempre aparece nos piores momentos. Agora, os dois estão presos em suas próprias situações, sem muito o que fazer a não ser esperar. E o tempo — esse carrasco! — acaba corroendo mais do que apenas metal — ele também desgasta a esperança e a alegria.
Berger é conhecido por sua versão de Branca de Neve (2012), que mistura touradas e uma paixão profunda pelo cinema mudo. Esse filme bombou mundialmente, faturando um monte de Goyas — o Oscar espanhol — e mostrou a habilidade dele em contar histórias apenas com som e imagem. E aqui ele eleva isso a outro nível. Os personagens, tanto o Robô quanto o Cão, e até o zoológico maluco de criaturas que os rodeia, não precisam de diálogos tradicionais. Na mão de Berger, você sente tudo através de sons, piadas visuais e expressões faciais que falam mais do que mil palavras. A animação é tão poderosa que entrega uma carga emocional completa. E enquanto ele se inspira na visão de Varon, onde todos os seres, grandes ou pequenos, têm suas manias humanas, ele consegue equilibrar o absurdo com a realidade crua de Nova York. É uma mistura única que faz você se sentir em casa e completamente fora dela ao mesmo tempo.
Não tem nada de sentimentalismo barato na história da amizade interrompida deles, e definitivamente não é cínico. Ele está ali preparando você para aquele clímax emocionante que você reconheceria em filmes de comédias românticas. O que realmente importa não é o que acontece com o Robô e o Cão antes do último dia de verão, ou quais sonhos podem surgir nesse meio tempo — embora o filme ofereça uma gama de delírios que vai de pesadelos de contos de fadas a extravagâncias. O lance mesmo é o que vai acontecer quando esses dois amigos se reencontrarem, depois de meses separados e de tantas aventuras malucas que vão culminar em um reencontro inevitável.
Prepare-se para a montanha-russa emocional que está por vir. Essa obra é uma verdadeira joia, misturando a estética dos desenhos animados antigos com a profundidade dos dramas. E a canção que se torna ponto-chave do filme vai grudar em sua cabeça. Em sua ode emocionante sobre olhar para trás e seguir em frente, essa animação consegue despedaçar seu coração e reconstruí-lo ao mesmo tempo. A visão sobre essa história em quadrinhos é um marco, principalmente quando aliamos a ideia de contar uma história de uma maneira convincente através dos traços criativos que saem de seus dedos. A ideia por trás da animação enquanto um gênero de criar novas perspectivas no cinema é um marco — e Meu Amigo Robô é um clássico moderno que permite que eu seja otimista sobre o cinema.